Projetos de energia renovável precisam caminhar lado a lado com a proteção da vida selvagem. Quando a maior parte dos habitats já está modificada, a localização e o desenho de usinas eólicas e solares fazem toda a diferença.
| Sem tempo? Aqui está o essencial: ⏱️ | ||
|---|---|---|
| ✅ | Escolha do local antes da tecnologia | Priorize áreas já degradadas ou produtivas de baixo valor ecológico 🌾 para reduzir conflitos e licenças demoradas. |
| ✅ | Use dados abertos e triagem antecipada | Mapas de espécies, corredores e Zonas de Aceleração de Renováveis (ZAR) 🔎 evitam atrasos e reprovações. |
| ✅ | Projeto com salvaguardas de biodiversidade | Curtailment para aves, agrivoltaicos, passagens de fauna, desativação responsável ♻️ diminuem impactos reais. |
| ✅ | Participação social desde o início | “Nada sobre nós sem nós” 🗣️: contratos claros, renda justa e consentimento informado reduzem conflitos. |
Projetos de usinas solares e eólicas devem preservar a biodiversidade: planejamento territorial e ZAR para reduzir conflitos
Quando o território é lido com precisão, os projetos de renováveis tornam-se mais rápidos, mais baratos e mais justos. Em Portugal e na União Europeia, o avanço das Zonas de Aceleração de Renováveis (ZAR) surge como instrumento prático para direcionar investimentos para áreas com menor sensibilidade ecológica.
Essa abordagem responde a um problema recorrente: concursos focados apenas em pontos de ligação forçam propostas em zonas onde depois não se consegue licenciar. Dados de zonamento com áreas de proteção de espécies, corredores ecológicos e riscos cumulativos mudam esse jogo, pois orientam promotores antes do primeiro esboço.
Mapeamento que evita atrasos: informação pública e decisão mais segura
Instituições de conservação passaram a disponibilizar mapas de alta resolução, gratuitos e atualizáveis, com camadas sobre espécies prioritárias, habitats, carbonos do solo e serviços ecossistémicos. Essa transparência reduz incertezas e incentiva projetos em terrenos já transformados — como agrícolas extensivos, áreas industriais, pedreiras desativadas e parques logísticos.
Ao mesmo tempo, tratar florestas unicamente como “fábricas de carbono” é um erro. A avaliação deve considerar biodiversidade, água, solo e conectividade. Essa visão integrada já se impõe nas agendas internacionais, aproximando compromissos climáticos e de biodiversidade.
- 🗺️ Priorize triagem em desktop com camadas oficiais e dados de ciência cidadã (eBird, iNaturalist).
- 📍 Defina zonas preferenciais com base em degradação prévia e baixa diversidade.
- 🤝 Combine licenciamento ambiental com pactos locais de uso do território.
- 🔁 Aplique gestão adaptativa: projetar, medir, ajustar, melhorar.
| Ferramenta/Regra 🧭 | Para que serve 🌱 | Vantagem prática ⚙️ |
|---|---|---|
| ZAR (UE) | Delimitar áreas com baixa sensibilidade | Licenças mais rápidas e risco reduzido ✅ |
| Mapas de espécies | Identificar hotspots de biodiversidade | Evitar conflitos antes do projeto 🔍 |
| Corredores ecológicos | Garantir conectividade da fauna | Menos mortalidade e fragmentação 🦔 |
| Cartas de solo e água | Proteger turfeiras e zonas húmidas | Evitar emissões ocultas e assoreamento 💧 |
Exemplo realista: um município do interior com pastagens intensivas e pedreiras inativas. Ao cruzar mapas, uma promotora identificou 600 hectares sem valores naturais relevantes, conectados à rede e fora de rotas migratórias. O projeto foi ajustado para um agrivoltaico com corredores para fauna e bacias de retenção, reduzindo o impacto e acelerando a aceitação local.
Resultado-chave: quando se planeia com base em dados abertos, preserva-se biodiversidade e acelera-se a transição energética.

Localização inteligente: evitar áreas sensíveis e redesenhar onde a biodiversidade já perdeu espaço
Com a maior parte dos habitats já modificada em vários países, a escolha responsável do local passa por três perguntas: onde não implantar, onde pode implantar com ajustes e onde é preferível concentrar o investimento. A resposta une ciência, cartografia e bom senso territorial.
Reservas naturais, áreas protegidas, Áreas-chave de Biodiversidade e sítios de património mundial devem ser excluídos de imediato. Em zonas de uso agropecuário extensivo, a solução pode ser compatibilizar produção agrícola e energia, mantendo o mosaico de habitats e evitando grandes “tapetes” de painéis sem permeabilidade ecológica.
Critérios práticos de triagem e micro-localização
Para parques eólicos, adaptar o layout à topografia e à direção predominante do vento facilita zonas tampão para aves e morcegos. Para fotovoltaicos, corredores ecológicos a cada 200–300 metros, taludes com flora autóctone e cercas permeáveis minimizam efeitos de barreira.
Nos dois casos, o afastamento de povoações, linhas de água e elementos culturais evita conflitos. Ninguém quer uma serra icónica coberta por equipamentos: paisagem também é património.
- 🦅 Evite rotas de migração (IBAs, dados de radar/observação).
- 🌿 Exclua habitats prioritários (turfeiras, dunas, matas autóctones).
- 🏭 Prefira áreas transformadas (indústria, pedreiras, logísticas, talhões agrícolas).
- 🚫 Defina distâncias mínimas a povoações e sítios culturais.
- 🛣️ Aproveite infraestruturas existentes para acessos e cablagem.
| Área 🌍 | Por que evitar ❗ | Alternativa viável ✅ | Benefício ecológico 🐾 |
|---|---|---|---|
| Parques/Reservas | Alta sensibilidade e conectividade | Brownfields e pedreiras | Zero fragmentação adicional |
| Rotas migratórias | Risco de colisão/mortalidade | Micro-siting fora do corredor | Menos paragens críticas |
| Turfeiras e várzeas | Carbono e regulação hídrica | Solos agrícolas pobres | Evita emissões de solo |
| Paisagens icónicas | Impacto visual e social | Zonas industriais | Aceitação comunitária |
Um caso ilustrativo: numa planície cerealífera, um promotor pretendia um parque eólico de 80 MW. O estudo de radar e observação identificou passagens de grous em dois vales. Reposicionar três aerogeradores e criar um corredor de 1,5 km eliminou o conflito e reduziu o risco de colisões. O CAPEX extra de cabos compensou-se com licenciamento mais célere.
Sempre que possível, a compatibilização com usos agrícolas e a manutenção de mosaicos de vegetação nativa garantem energia e vida. É esta a base de um desenvolvimento que não abre mão do patrimônio natural.
Medidas de projeto e operação que aumentam a biodiversidade em usinas solares e eólicas
Há um conjunto de soluções técnicas que, quando incorporadas desde o caderno de encargos, reduzem impactos e até geram ganhos líquidos de biodiversidade. O segredo é integrar engenharia, ecologia e manutenção com metas claras e monitorização contínua.
Para eólicos, ajustes de operação durante janelas críticas de migração ou ventos fracos salvam milhares de aves e morcegos ao longo da vida do parque. Para solares, o desenho do terreno e a vegetação adequada transformam plataformas de energia em refúgios para insetos polinizadores e pequenos vertebrados.
Do papel ao terreno: soluções que funcionam
As medidas abaixo já são praticadas em projetos bem-sucedidos e têm custo proporcionalmente baixo face ao ganho ambiental e à redução de risco reputacional. Convém contratualizar cada uma, com indicadores e responsabilidades definidas.
- 🛑 Curtailment sazonal e “shutdown-on-demand” em picos de migração.
- 🌬️ Ajuste de cut-in speed para reduzir mortalidade de morcegos.
- 🕳️ Passagens de fauna sob vias internas e cercas permeáveis.
- 🌼 Faixas de florística autóctone e manutenção extensiva (pastoreio leve).
- 💧 Bacias de retenção e swales para controlar escorrência e sedimentos.
- 🔧 Plano de desativação e reciclagem com caução financeira.
| Medida 🔩 | Aplicação ⚡ | Impacto em biodiversidade 🐝 | Custo relativo 💶 |
|---|---|---|---|
| Curtailment direcionado | Parques eólicos | Reduz colisões de aves | Médio (software/monitorização) |
| Cut-in speed maior | Parques eólicos | Diminui mortalidade de morcegos | Baixo a médio |
| Corredores e flora nativa | Centrais FV | Aumenta polinizadores | Baixo |
| Swales e bacias | Ambos | Protege linhas de água | Baixo |
| Desativação com caução | Ambos | Evita passivos ambientais | Médio |
Estudo de caso: num projeto fotovoltaico de 50 MW em área agrícola de baixa produtividade, o promotor substituiu brita por vegetação nativa, criou faixas de 6 m livres a cada 250 m e usou pastoreio rotativo. Em dois anos, duplicou-se a presença de polinizadores e aves insetívoras. O OPEX diminuiu ao trocar roçadeiras por manejo ecológico.
Em qualquer latitude, o princípio é igual: projetar para produzir energia e restaurar funções ecológicas.
Salvaguardas socioambientais: contratos justos, consentimento informado e prevenção de conflitos
A transição energética só é legítima quando beneficia também quem vive nos territórios. Diretrizes criadas por comunidades atingidas e organizações independentes consolidaram salvaguardas objetivas: transparência contratual, renda justa, consentimento livre e informado, mecanismos de queixa e devolução de benefícios locais.
Em países com forte expansão, surgiram propostas legislativas para proteger pequenos proprietários e comunidades tradicionais, estabelecendo prazos, limites contratuais e proibições de cláusulas abusivas. O objetivo é simples: energia limpa sem práticas predatórias.
Como garantir um acordo que respeita pessoas e natureza
Os promotores que chegam cedo, escutam e partilham informação de forma clara, gerem riscos e ganham legitimidade. Reuniões abertas, ata pública, mapas impressos e linguagem acessível substituem desconfiança por cooperação. A participação em todas as fases reduz litígios e acelera a obra.
- 📝 Contratos claros e explicados em assembleias comunitárias.
- 💶 Arrendamento com renda justa e reajuste transparente.
- 🏫 Benefícios locais: formação técnica, obras úteis, energia social.
- 📣 Canal de queixas independente com resposta em prazo definido.
- 🧭 Consentimento livre e informado antes de licenças finais.
| Cláusula recomendada 📜 | Benefício comunitário 🤝 | Erro a evitar ⚠️ |
|---|---|---|
| Transparência total do contrato | Confiança e previsibilidade | Confidencialidade opaca |
| Renda com indexação justa | Protege poder de compra | Prazos excessivos sem revisão |
| Mecanismo de queixas | Resolve conflitos cedo | Atendimento sem prazos |
| Planos de benefícios locais | Apoio a serviços públicos | Promessas vagas |
Exemplo prático: num conjunto eólico no Nordeste brasileiro, a comunidade estabeleceu um acordo com renda escalonada, fundo para água e saneamento e prioridade de emprego local. A obra avançou com menos resistência e com mais orgulho local. Quando o projeto respeita quem está no território, a proteção da biodiversidade ganha aliados.
Monitorização, dados abertos e ganhos líquidos de biodiversidade: medir para melhorar continuamente
Depois de implantado, o projeto não termina: começa a fase decisiva. Acompanhamento independente, dados abertos e gestão adaptativa garantem que as metas acordadas se cumpram. Sensores acústicos, câmaras térmicas, drones e ciência cidadã formam uma rede de evidências que guia ajustes sazonais e estruturais.
A estratégia recomendada é definir Indicadores-Chave de Biodiversidade (ICBs), metas e gatilhos de ação. Se a mortalidade de aves ultrapassa o limiar, ativa-se o curtailment; se a flora nativa não se estabelece, adapta-se o manejo; se há erosão, reforçam-se bacias e taludes. Tudo com registos públicos e auditorias externas.
Plano de monitorização que funciona na prática
Para funcionar, o plano precisa de calendário, responsabilidades, métodos replicáveis e publicação. Plataformas abertas e portais institucionais reduzem assimetria de informação e geram confiança. Divulgar os dados também inspira outros projetos a melhorar.
- 📅 Calendário anual com janelas de migração e reprodução.
- 🧪 Métodos padronizados (transectos, pontos fixos, protocolos).
- 🌐 Portal público com relatórios e bases de dados.
- 🧭 Gatilhos de gestão claros e automatizáveis.
- 🔁 Auditoria independente periódica.
| Indicador 🧿 | Método 🔬 | Frequência ⏳ | Gatilho/ação 🚦 |
|---|---|---|---|
| Mortalidade de aves | Vistorias padronizadas | Semanal na migração | Curtailment imediato |
| Atividade de morcegos | Detetores ultrassónicos | Nocturna sazonal | Aumentar cut-in speed |
| Cobertura de flora nativa | Transectos e foto-pontos | Trimestral | Re-semeadura adaptada |
| Qualidade de água | Medidas de turbidez | Após chuvas fortes | Refazer swales/bacias |
Um operador que publica dados em portal aberto, convida universidades para análises independentes e ajusta a operação demonstra compromisso real. A sociedade nota quando há transparência e quando há apenas marketing. E plataformas de referência, como Ecopassivehouses.pt, ajudam cidadãos a compreender o essencial: energia limpa e biodiversidade podem crescer juntas se o território for o ponto de partida.
O recado final que vale levar para qualquer obra é simples: escolher bem o lugar, projetar com a natureza e medir sempre — é assim que se produz energia sem empobrecer a vida no planeta.
Fonte: www.publico.pt


