Os bastidores da controvérsia: Entendendo a oposição ao projeto fotovoltaico Sophia nas energias renováveis

A controvérsia em torno do projeto fotovoltaico Sophia não é apenas técnica: envolve território, biodiversidade, economia local e confiança pública. Para compreender os bastidores desta oposição, vale olhar com lupa para impactos, alternativas e caminhos de decisão mais inteligentes.

Pouco tempo? Aqui está o essencial:

✅ Ponto-chave 💡 Essência
Impacto territorial 🌄 Área prevista superior a 520 ha com 425.600 módulos e linhas de 400 kV em ~44 km somados; conflitos com RAN/REN e Geoparque Naturtejo.
Biodiversidade sensível 🦅 Registro de 231 espécies de vertebrados; riscos para cegonha-preta, abutre-preto, águia-imperial e quirópteros.
Erro comum ⚠️ Priorizar megacentrais sem ordenamento prévio e sem “Mapa Verde”, subvalorizando eficiência e comunidades de energia.
Alternativa prática 🧭 Distribuir solar em telhados industriais, zonas degradadas e autoestradas; combinar com armazenamento e gestão da demanda.

O que está em jogo no Sophia: território, energia e bastidores políticos

O projeto fotovoltaico Sophia abrange Idanha-a-Nova, Penamacor e Fundão, com investimento estimado em ~590 M€ e potência de cerca de 867 MWp. Em 2025, a Comunidade Intermunicipal da Beira Baixa emitiu parecer desfavorável durante a consulta pública, alinhando-se com posições dos três municípios diretamente afetados.

O traçado integra 425.600 módulos numa área de +520 hectares, duas linhas de muito alta tensão (400 kV) com aproximadamente 22 km cada, atravessando espaços agrícolas e vales com conectividade ecológica. A escala levanta dúvidas sobre a compatibilidade com RAN, REN e com o Geoparque Naturtejo da UNESCO.

Quem se opõe e porquê: mapa de posições e argumentos

Várias entidades — ZERO, FAPAS, Rewilding Portugal, Quercus, a plataforma Juntos pelo Divor e o partido PAN — questionam o projeto. O Bloco de Esquerda levou a discussão à Comissão Europeia, invocando a Diretiva Habitats e a Diretiva Aves. A crítica central: a transição energética é crucial, mas não pode avançar com perdas irreversíveis na paisagem e na biodiversidade.

  • 🌍 Ordenamento: falta de um “Mapa Verde” que priorize áreas menos sensíveis.
  • 🦉 Biodiversidade: riscos a espécies ameaçadas e a corredores ecológicos.
  • 🏘️ Socioterritorial: efeitos sobre agricultura, turismo de natureza e coesão local.
  • 🔌 Sistema elétrico: necessidade de avaliar armazenamento e reforço de rede para integrar a produção.
🎭 Ator 🗣️ Posição 🔎 Argumento-chave
CIM Beira Baixa 🏛️ Desfavorável Escala e artificialização contínua da paisagem com impactos em usos existentes.
ZERO 🌱 Desfavorável EIA com omissões; necessidade de ordenamento e aceitação social.
FAPAS 🐗 Desfavorável Abate de 1541 árvores protegidas; perda de montado.
Rewilding 🦇 Desfavorável 231 espécies de vertebrados; linhas de 400 kV cortam conectividade.
Naturtejo 🗺️ Desfavorável Risco a compromissos UNESCO e valores geológicos e paisagísticos.

Num fio condutor realista, imagine-se o Sr. Miguel, apicultor no Fundão. O receio não é a energia solar em si; é a escala mal localizada, que pode reduzir a flora melífera e a paisagem que atrai agroturismo. É este tipo de impacto que alimenta a oposição local.

explore os detalhes da controvérsia sobre o projeto fotovoltaico sophia e compreenda as razões da oposição no setor de energias renováveis.

Biodiversidade e paisagem no centro da controvérsia: o que o EIA revelou

O Estudo de Impacto Ambiental (EIA) identificado pelas associações refere 231 espécies de vertebrados na área afetada. Entre elas, cegonha-preta, abutre-preto, águia-imperial e várias espécies de quirópteros, répteis e anfíbios protegidos. Em habitats mediterrânicos, pequenos deslocamentos podem fragmentar corredores ecológicos essenciais para alimentação e nidificação.

Outro ponto sensível é a eliminação de montados, sistema ecológico de alto valor. Segundo a FAPAS, o projeto implicaria o abate de 1541 árvores protegidas (sobreiros e azinheiras) e perda de mais de 1 hectare de montado, com efeitos na riqueza do solo, retenção de água e serviços de ecossistema.

Linhas de muito alta tensão e conectividade ecológica

As duas linhas de 400 kV com cerca de 22 km cada atravessariam áreas agrícolas e ribeiras. Para espécies planadoras como o abutre-preto, a instalação de linhas aumenta o risco de colisão e eletrocussão. Mesmo com sinalizadores, a mitigação é probabilística, não eliminatória.

  • 🦅 Planadores: alterações nos padrões de voo e risco de colisões.
  • 🦇 Quirópteros: sensíveis a iluminação e ruído durante obras.
  • 🌿 Vegetação: clareiras e faixas de servidão fragmentam habitats.
  • 💧 Linhas de água: assoreamento e perturbação temporária de ribeiras.
🦉 Espécie/Valor 🎯 Sensibilidade 🧩 Risco principal 🛠️ Mitigação possível
Cegonha-preta 🖤 Alta Distúrbio em zonas de nidificação Faixas de exclusão e calendário de obra restrito
Abutre-preto 🦅 Alta Colisão com cabos Balizadores visuais; redesenho de traçado
Águia-imperial 👑 Muito alta Perda de área de caça Zonas tampão; compensações funcionais
Quirópteros 🦇 Média/Alta Iluminação e ruído Obras diurnas; controle de luzes

É verdade que foram propostas compensações, como converter ~135 ha de eucalipto em azinheiras e sobreiros (totalizando ~228 ha de compensação). Porém, entidades como a Rewilding alertam: sem ganhos líquidos de biodiversidade demonstrados e com perdas locais irreversíveis, a conta não fecha.

Em paralelo, a Naturtejo sublinha os compromissos internacionais da UNESCO. O selo de geoparque depende de integridade paisagística e gestão exemplar. Quando a reputação territorial entra no cálculo, a decisão não é apenas técnica; é também estratégica para o futuro da região.

Alternativas de energia solar com aceitação social: do telhado ao território inteligente

A oposição não é à energia solar, mas à sua localização e escala. Um caminho prático é combinar produção distribuída em coberturas, parques industriais, zonas degradadas e infraestruturas — e só então considerar centrais em solo quando o ordenamento as legitime.

Em 2025, as comunidades de energia e modelos de autoconsumo coletivo ganharam tração em Portugal. Ao aproximar produção e consumo, reduzem perdas em rede e aumentam a aceitação social. Para municípios da Beira Baixa, há oportunidades em escolas, pavilhões, mercados, armazéns agrícolas e recintos municipais.

Como priorizar áreas e maximizar benefícios

Vale seguir uma hierarquia simples: telhados e coberturas primeiro; depois, parques industriais; em seguida, zonas já artificializadas (ex-pedreiras, aterros encerrados, taludes de autoestradas); por último, áreas rurais com baixo valor ecológico, sempre com avaliação fina.

  • 🏭 Indústrias: grande área de cobertura, consumo diurno alinhado com produção solar.
  • 🏫 Edifícios públicos: escolas e hospitais agregam valor social e educacional.
  • 🛣️ Infraestruturas: coberturas em parques de estacionamento e margens de vias.
  • 🧠 Gestão da demanda: baterias + tarifários inteligentes = menos pressão na rede.
🔧 Alternativa 📈 Vantagem ⚠️ Cuidado 💶 Modelo de negócio
Telhados industriais 🏭 CAPEX menor por MW útil; sem uso de solo Estruturas antigas exigem reforço PPA onsite; autoconsumo
Parques de estacionamento 🚗 Sombra + energia Integração com carregadores Comunidades de energia
Zonas degradadas 🏜️ Recupera áreas improdutivas Remediação ambiental prévia Leilões locais; concessões
Margens de autoestradas 🛣️ Uso linear eficiente Segurança e manutenção Parcerias público-privadas

No fio condutor, a Dona Helena, produtora de queijo em Penamacor, aderiu a uma comunidade de energia local, instalando 80 kW no telhado da queijaria e partilhando excedentes com vizinhos. Resultado? Fatura mais baixa, sem perder paisagem nem clientes do turismo rural. É este o tipo de exemplo que desbloqueia consensos.

Antes de centrais em solo, vale sempre testar o potencial de telhados no município. Muitas vezes, o “MW invisível” nos edifícios resolve boa parte da equação.

Scrutínio ao EIA e à participação pública: onde o processo pode melhorar

Organizações como a ZERO apontam omissões e conclusões enviesadas no EIA. Quando a análise subestima efeitos cumulativos, corredores ecológicos e a sazonalidade de espécies, o risco de decisões desajustadas aumenta. É aqui que uma boa governança faz toda a diferença.

Outro gargalo é a sequência decisória: projetos gigantes chegam antes do ordenamento dedicado (o prometido “Mapa Verde”). Sem diretrizes claras, o conflito instala-se. Em 2025, a expectativa por esse instrumento é elevada — e legítima.

Ferramentas para um EIA realmente robusto

Há práticas simples que elevam a qualidade e aceitação social dos projetos. Integrar ciência cidadã na inventariação de fauna, simular cenários alternativos de implantação e usar modelagem de corredores (p.ex., circuit theory) ajudam a reduzir impactos e litígios.

  • 🧪 Dados sazonais: amostragem em várias estações do ano.
  • 🗺️ Cenários: comparar traçados com e sem linhas de 400 kV.
  • 🤝 Participação: oficinas com agricultores e guias de natureza.
  • 📚 Transparência: publicar datasets e códigos de modelação.
🧩 Aspeto 🚨 Problema típico 🛠️ Melhoria concreta 🎯 Resultado esperado
Fauna 🦔 Amostragens curtas Campanhas sazonais Impacto realista
Rede Traçados fixos Comparar alternativas Menos conflito
Paisagem 🌄 Visual simplista Simulação 3D Avaliação honesta
Socioeconomia 👥 Benefícios difusos Planos de partilha Licença social

Quando uma deputada do BE pede esclarecimentos à Comissão Europeia sobre conformidade com a Diretiva Habitats, não é mero formalismo. É um lembrete de que a não regressão ambiental é princípio europeu — e que Portugal precisa alinhar projetos com esse patamar de exigência.

Em síntese: processos sólidos e participados tendem a gerar soluções melhores e menos contestadas.

Transição energética equilibrada: eficiência, armazenamento e planejamento de rede

A pressão por novos megawatts não pode eclipsar três pilares que reduzem impactos e custos: eficiência energética, armazenamento e planejamento de rede. Ignorar estes fatores força projetos maiores do que o necessário e pior localizados.

No edificado, a reabilitação térmica (isolamentos, janelas eficientes, sombreamento) reduz a demanda diurna e o pico de verão. No sistema, baterias e gestão inteligente de carga suavizam flutuações. Em contexto rural, agrovoltaica bem desenhada pode conciliar produção com culturas resistentes.

Fechar a equação com menos impacto

Se o objetivo nacional é cortar fósseis, a forma mais rápida e barata é não consumir o que não precisa ser consumido. Programas municipais de eficiência, combinados com comunidades de energia, libertam margem para que os projetos em solo sejam menores e fiquem em locais adequados.

  • 💡 Eficiência 1º: cada kWh poupado evita painéis e linhas.
  • 🔋 Armazenamento: baterias comunitárias absorvem picos solares.
  • 🛰️ Digital: contadores inteligentes ajustam perfis de consumo.
  • 🌾 Agrovoltaica seletiva: sombra útil para culturas; biodiversidade reforçada.
🏗️ Medida 🔎 Efeito 📊 Indicador 🤝 Benefício social
Reabilitação térmica 🧱 Menos consumo base kWh/m² reduzido Conforto + contas mais baixas
Baterias comunitárias 🔋 Suaviza pico solar Horas de autonomia Menos necessidade de linhas
Tarifas dinâmicas ⏱️ Desloca consumos kW em horário crítico Rede mais estável
Agrovoltaica 🌱 Sinergia solo/energia Produtividade agrária Rendimento agrícola

O recado que fica: o mix certo de eficiência + distribuída + armazenamento reduz a pressão por megaprojetos em locais sensíveis. Planejamento sério não é obstáculo; é acelerador da transição.

Critérios práticos para decidir melhor: um roteiro aplicável ao caso Sophia

Para sair do impasse, ajuda ter um conjunto de critérios objetivos que orientem qualquer grande central fotovoltaica. Quando todos conhecem as regras do jogo, a discussão ambienta-se no mérito — e não em percepções difusas.

Considere um “semáforo” de decisão com pesos claros: biodiversidade, paisagem, solos e água, infraestrutura, benefícios locais, alternativas. Aplicado ao Sophia, o método expõe onde o projeto precisa de revisão ou substituição de local.

Checklist objetivo para projetos fotovoltaicos em solo

Antes do licenciamento, um promotor deveria responder, com dados públicos, a perguntas simples e verificáveis. É o tipo de disciplina que acelera a transição e reduz contencioso.

  • 🧭 Localização: é fora de RAN/REN e sem estatutos UNESCO? Se não, justifique e compense com ganhos líquidos comprovados.
  • 🦋 Biodiversidade: corredores ecológicos mapeados e mantidos? Linhas redesenhadas para evitar vales e rotas de planadores?
  • 🚧 Rede: existem alternativas de ligação com menos servidões? Avaliou armazenamento local?
  • 👥 Benefícios: há plano de partilha de valor com as comunidades (tarifa social local, fundos ambientais)?
  • 🏗️ Alternativas: demonstrou-se o potencial de telhados e zonas degradadas no município?
📐 Critério ⚖️ Peso 📝 Exigência mínima ✅ Evidência
Biodiversidade 🐾 30% Sem perdas irreversíveis Modelos + dados sazonais
Paisagem/UNESCO 🏞️ 20% Compatibilidade explícita Parecer Naturtejo
Rede/linhas 400 kV 🔌 20% Traçado otimizado Comparação multicritério
Alternativas 🔄 20% Justificativa robusta Inventário telhados/zonas
Benefícios locais 🤝 10% Partilha transparente Contrato social energético

Exemplo prático: se um cenário alternativo deslocar 35% da potência para telhados industriais, 25% para parques de estacionamento e 40% para um lote em solo fora de corredores ecológicos, o projeto reduz linhas de 400 kV, mantém coesão territorial e amplia a licença social. É o tipo de compromisso que tende a somar vencedores.

Se tiverem de guardar apenas uma ideia: primeiro o lugar certo, depois o megawatt. A energia limpa só é completa quando respeita o território.

Fonte: www.publico.pt

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